terça-feira, maio 24

Maggio 43: representando memórias de guerra


Maggio 43, peça exibida nos passados dias 12, 13 e 14 no Teatro Taborda em Lisboa, ao encargo d'Os Artistas Unidos, é uma obra do dramaturgo Davide Enia que nos leva até aos bombardeamentos americanos da cidade de Palermo, durante a II Guera Mundial.
"Porque praticamente já não havia estradas, havia pedaços de casa, traves de madeira, pedras... às vezes, das ruínas, saíam cá para fora pedaços de braços, pernas, cabeças... eu e o meu irmão, que éramos miúdos, chamávamo-los «flores de carne», não sei porquê" - este é apenas um dos mais de 100 testemunhos obtidos por Enia nas entrevistas que obteve junto de sobreviventes, para escrever Maggio 43. Interessava a Enia a vida quotididiana de uma cidade onde ecoavam os bombardeamentos. A peça, que nos é narrada por uma criança de 12 anos, Gioacchino, parte do momento em que esta criança visita a sepultura do irmão e lhe conta tudo que aconteceu, quer com a sua família, quer com a história. E durante esta narração, o público vai tendo acesso a todos os possíveis estilhaços da memória de uma guerra mundial, da chegada dos americanos, dos bombardeamentos de Maio de 1943, da morte, do ruído das bombas, da pobreza, da fome, do medo.
Segundo o dramaturgo (em declarações ao jornal Público), em Maggio 43 há três tipos de guerra ocorrendo em simultâneo: a guerra do episódio histórico, a guerra entre as pessoas adultas (num novelo de tensões perante a fome, o medo e a morte) e a guerra interior de uma criança que deseja entrar no mundo dos mais velhos. A idade do narrador da história e mesmo a idade dos entrevistados (pessoas que durante a guerra tinham entre seis a vinte anos) reflectem o interesse de Enia em apresentar a guerra, segundo "um olhar puro sobre as coisas", segundo o olhar envolto de inocência de uma criança.
Palermo, cidade natal de Enia, foi a paisagem de guerra escolhida, talvez porque ainda hoje mostre os sinais dos bombardeamentos de 1943, talvez por ser, como Enia faz notar, uma metáfora do tempo em que vivemos: um tempo "feito de grandes feridas que vemos continuamente".
Fontes: